sexta-feira, 11 de abril de 2014

Sobre ser futura médica 4



"É no internato que mais se aprende!". Já ouvi muito essa frase de diversos amigos e professores. Sim, estão certos, de fato é onde mais estou aprendendo. Outra frase que já ouvi durante a minha vida toda é aquela clássica de que só aprendemos com os erros. Pois bem, concordo, aprendo com os meus erros e com o dos outros. E, ultimamente, tenho aprendido muito.
Na condição de interna estou na base da cadeia alimentar, só ganho dos períodos abaixo. Estou no primeiro período do internato e comecei a rodar justo onde se encontram os deuses e semi-deuses do hospital. No monte Olimpo do hospital onde estudo, me dei conta de que não tenho voz, sou "só a interna". Sou só uma das pessoas que evoluem os pacientes, que levam para fazer alguns exames, que basicamente tocam o serviço da enfermaria enquanto os deuses e semi-deuses estão em ou outro lugar,  treinando suas habilidades manuais. Confundindo pessoas com objetos, suponho eu. 

Tenho observado que, cada vez mais, tratam a doença, não o doente. Esquecem que por trás de uma colecistite, apendicite, câncer de cólon, de estômago, de pâncreas, seja lá do que for, tem um paciente. Isso gera uma revolta em mim, fico com raiva e frustrada ao mesmo tempo. Presencio situações muito erradas, desrespeitosas até, mas na minha condição dentro do monte Olimpo, estou de mãos atadas, sou "só a interna". Só a pessoa que "você deve ter se enganado, não aconteceu assim"!

Sou obrigada a aturar isso, de boca fechada. Pois bem, aprendo com exemplos. Dizem que a faculdade é muito técnica, que não aprendemos algumas coisas. Realmente, não existe um livro com o segredo de ser um bom médico. No entanto, eu, na minha humilde posição de interna, digo que a faculdade ensina muito mais do que pensamos que aprendemos, o problema é que só aprende quem quer, quem consegue observar o que acontece a sua volta e refletir sobre os fatos ocorridos. E, olha, acontece tanta coisa, mas tanta coisa a minha volta, que eu chego até a ficar sobrecarregada com o "aprendizado indireto".

Infelizmente, parte da afirmativa que fiz lá em cima, é verdadeira. Ninguém aprende a ser honesto e responsável na faculdade. Ninguém aprende a se importar com o próximo na faculdade. Isso vem de berço! Ninguém aprende a ter empatia pelo doente, isso é da personalidade de cada um. Podemos até desenvolver simpatia pela situação, o que ajuda na relação médico paciente, mas uma pessoa que não tem empatia, muito provavelmente, se não receber um empurrãozinho, ficará "desconectada".

Eu sou ingênua, cada vez que presencio algo de errado eu fico surpresa. Diante de alguns absurdos que vejo, fico pensando em como, cada vez mais, pessoas são capazes de fazer atrocidades. Uma vez, no medcurso, presenciei a seguinte cena: uma menina que estava com a perna imobilizada foi chamada atenção por apoiar a perna numa cadeira ao lado. A justificativa dada pela funcionária era de que alguns alunos vieram reclamar que ela estava atrapalhando a passagem. Ela teve que mudar de lugar. Pedir licença não existe não? Nem mudar de caminho? Eu fico aqui pensando: "Essa é a geração de futuros médicos..." 

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